sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

IV. De como a literatura nos transmite conceitos, mensagens e ensinamentos para compreender e enfrentar as dores da alma.

Atenuando a adversidade


Pelos caminhos da vida espreita em cada curva a adversidade. Esta nos toma de surpresa, e quase sempre sucumbimos, fragilizados pelo nosso próprio despreparo espiritual.

Inocentemente trilhamos nosso caminho, esperando encontrar nada além de flores e o reconhecimento natural de todos os nossos esforços

Todos nos esquecemos de que há um passado a resgatar. Ou nesta ou em anteriores existências. E as sementes que plantamos voluntária ou ou até inconscientemente frutificarão. E esses frutos sempre serão um dia colhidos. Ainda que ignoremos a ordem natural desse ciclo essencial.


Cabe citar agora três princípios, ensinados pela própria vida, e que podem significar muito na aceitação de nosso presente, e na atenuação das dores da alma.


I. Não se ganha sempre.


II. A Vida vale pelos seus intervalos ( a leitura dessas linhas é um intervalo de nossas vidas ).


III. Quando a realidade for insuportável - delire e seja feliz ! A busca pela felicidade é o maior compromisso do homem para com o seu espírito.




Entretanto, a aplicação dessas normas, atenuando a adversidade que pode tomar conta de nossas vidas, para resultar em uma sensação de felicidade necessita de uma quarta iniciativa.


IV. Para atingirmos a felicidade, é essencial que aprendamos a reconhecer, resgatar e a perdoar nossos próprios erros. A culpa é dor que corrói a alma e destrói qualquer esperança.


Luís Vaz de Camões (1524-1580)

O maior representante do Renascimento português, imortalizado no épico Os Lusíadas, entendeu mais que ninguém, porque as sofreu, as dores da alma. E em seus sonetos, cuja base filosófica é o neoplatonismo, traduziu os sentimentos mais arrebatadores que lhe mitigavam a alma. Alternando em sua poesia o amor e a sensualidade, fez da mullher um ente superior, imagem do Bem e da Beleza. Seguem três de seus mais importantes sonetos, todos introduzindo a importância do amor como lenitivo para as dores da alma

*


Amor é um fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.



É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É umj cuidar que ganha em se perder.



É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.



Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é mesmo Amor?


***


Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida, descontente,
Repousa lá no céu eternamente
E viva eu cá na terra sempre triste.



Se lá no assento etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente
Que já nos olhos meus tão puro viste.



E se vires que pode merecer-te
Alguma cousa a dor que me ficou
Da mágoa sem remédio de perder-te,



Roga a Deus, que teus anos encurtou
Que tão cedo de cá me leve a ver-te
Quão cedo de meus olhos te levou.

***

Busque Amor novas artes, novo engenho,
Para matar-me, e novas esquivanças;
Que não pode tirar-me a esperanças,
Que mal me tirará o que não tenho.



Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
Andando em bravo mar, perdido o lenho.



Mas conquanto não pode haver desgosto
Onde esperanças falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê;



Que dias há que na alma me tem posto
Um não sei quê, que nasce e não sei onde,
Vem não sei como, e dói não sei porquê.



***

Letícia Thompson
Escritora poetisa brasileira, natural do Espírito Santo, que nos chama a refletir e reavaliar valores, que conduzem o nosso dia-a-dia.


Se é verdade que a cada dia basta a sua carga,
porque entào teimamos em levar para o dia seguinte nossas mágoas e dores? Ou para a semana seguinte, mês ou ainda anos?

Nos apegamos ao sofrimento e ao ressentimento. Como às coisinhas que guardamos em nossas gavetas. Sabendo-as inúteis, mas sem coragem para jogá-las fora.

Vivemos com o lixo da existência, quando tudo seria mais claro e límpido com o coração renovado.

As marcas e cicatrizes ficam para nos lembrar da vida, do que fomos, do que fizemos, e do que precisamos evitar.

Não há ainda cirurgia plástica para a alma. Que poderia extirpar todas as experiências, deixando-nos novos.

Ainda bem...
Não devemos esquecer do passado, de onde viemos, do que fizemos, dos caminhos que percorremos.

Não há como esquecer as vitórias, quedas e lutas.

Menos ainda das pessoas, dos encontros, que direcionaram nossas vidas, muitas vêzes sem que soubéssemos.

Perdoar a quem nos feriu dói mais na pessoa que o ódio sentido e preservado durante toda uma vida.

O que não podemos é carregar com teimosia o ódio, o rancor, mágoas, sentimento de
derrota e o ressentimento.

As mágoas envelhecidas marcam-nos o rosto, nossos atos e moldam nossa existência.

Precisamos com muita coragem e ousadia abrir a gaveta do coração e
esvaziá-la.
E quando só ficarem as lembranças as alegrias, do bem que nos fizeram, das rosas secas, mas carregadas e amor, mais espaço haverá para novos encontros.

Assim nos tornamos mais atraentes. Mais bonitos. Mais leves e mais fáceis de carregar. Mesmo para aqueles que já nos amam.

Sua vida merece que a cada novo dia você lhe dê mais uma chance para que ela seja plena e feliz.



***

CHICO XAVIER


Nasceste no lar que precisavas, vestiste o corpo físico que merecias.
Moras onde melhor Deus te proporcionou,de acordo com teu adiantamento.
Possuis os recursos financeiros coerentes com as tuas necessidades, nem mais,
nem menos, mas o justo para as tuas lutas terrenas.
Teu ambiente de trabalho é o que elegeste espontaneamente para a tua realização.
Teus parentes, amigos são as almas que atraíste, com tua própria afinidade.

Portanto, teu destino está constantemente sob teu controle.
Tu escolhes, recolhes, eleges, atrais, buscas, expulsas, modificas tudo aquilo
que te rodeia a existência.
Teus pensamentos e vontade são a chave de teus atos e atitudes...são as fontes de atração e repulsão na tua jornada vivência

Não reclames nem te faças de vítima. Antes de tudo, analisa e observa.
A mudança está em tuas mãos.
Reprograma tua meta,busca o bem e viverás melhor.


Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo,
Qualquer Um pode Começar agora e fazer um Novo Fim.


***

CHICO XAVIER


Nasceste no lar que precisavas, vestiste o corpo físico que merecias.
Moras onde melhor Deus te proporcionou,de acordo com teu adiantamento.
Possuis os recursos financeiros coerentes com as tuas necessidades, nem mais,
nem menos, mas o justo para as tuas lutas terrenas.
Teu ambiente de trabalho é o que elegeste espontaneamente para a tua realização.
Teus parentes, amigos são as almas que atraíste, com tua própria afinidade.

Portanto, teu destino está constantemente sob teu controle.
Tu escolhes, recolhes, eleges, atrais, buscas, expulsas, modificas tudo aquilo
que te rodeia a existência.
Teus pensamentos e vontade são a chave de teus atos e atitudes...são as fontes de atração e repulsão na tua jornada vivência

Não reclames nem te faças de vítima. Antes de tudo, analisa e observa.
A mudança está em tuas mãos.
Reprograma tua meta,busca o bem e viverás melhor.


Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo,
Qualquer Um pode Começar agora e fazer um Novo Fim.


***

CHICO XAVIER


Nasceste no lar que precisavas, vestiste o corpo físico que merecias.
Moras onde melhor Deus te proporcionou,de acordo com teu adiantamento.
Possuis os recursos financeiros coerentes com as tuas necessidades, nem mais,
nem menos, mas o justo para as tuas lutas terrenas.
Teu ambiente de trabalho é o que elegeste espontaneamente para a tua realização.
Teus parentes, amigos são as almas que atraíste, com tua própria afinidade.

Portanto, teu destino está constantemente sob teu controle.
Tu escolhes, recolhes, eleges, atrais, buscas, expulsas, modificas tudo aquilo
que te rodeia a existência.
Teus pensamentos e vontade são a chave de teus atos e atitudes...são as fontes de atração e repulsão na tua jornada vivência

Não reclames nem te faças de vítima. Antes de tudo, analisa e observa.
A mudança está em tuas mãos.
Reprograma tua meta,busca o bem e viverás melhor.


Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo,
Qualquer Um pode Começar agora e fazer um Novo Fim.


***
RODGERS & HAMMERSTEIN II
Richard Charles Rodgers ( 1902 – 1979) compositor americano autor de mais de 900 júsicas e inúmeros musicais da Brodway. Em parceria com Oscar Hammerstein II. Criou sucessos inesquecíveis como este tema para o musical “Caroussel”. Premiado com o Emmy, Grammy,Oscar e Tony/EGOT além de um premio Pulitzer.

When you walk through a storm,
hold your hand up the head
and don´t be afraid of the dark.
At the end of the storm is a golden star
And sweet silver songs in the air…

Walk on trhough the storm,
Walk on through the rain,
till your dreams be touched and true.

Walk on, walk on,
With a hope in your heart
And you will never walk alone,
Believe,
You will never walk alone…

***
PAULO SANTANA
PORQUE AS ALMAS SOFREM?
(Zero Hora, 02 de novembro de 2008, p. 51, )


A vida só tem uma lógica garantida se não for única, se constituir meramente em apenas uma etapa, uma passagem, uma estação, a qual sobrevirão outras vidas, outras passagens, outras estações.
Fiquei sabendo pelo livro A Nova Ciência e a Fé, recentemente lançado, de autoria do porto-alegrense Mário Costa de Araújo Lima, que os grandes filósofos gregos Platão e Sócrates, duas das inteligências mais luminosas da humanidade, eram reencarnacionistas.
A reencarnação é a idéia segundo a qual os espíritos em seu processo evolutivo vivem muitas vidas, em diferentes corpos, assumindo, portanto distintas personalidades.
Eu só posso admitir a idéia de um Deus bom, de um Deus justo, de um Deus misericordioso e acima de tudo, de suprema lucidez e sabedoria, se concluir que não há uma vida única, que as pessoas que se tornam mártires, que vivem em extremo sofrimento, ou sobre as quais se abateram as injustiças e os tormentos, terão em outra vida recompensas que restituirão à sua vida um plano de justiça e lógica de proporcionalidade.
Como eu escrevi em outras colunas, isto não vai ficar assim.
Não pode Deus ter criado ao mesmo tempo uma besta e um filósofo, um rico e um miserável, um cruel e um bondoso, um feio e um bonito, um dotado de raras virtudes, outro pleno de todos os defeitos.
Uma só passagem pela vida, pela efemeridade em que ela consiste, pela incompletude das experiências que se desenrolam para um só indivíduo em particular, pela exiguidade do seu campo de desenvolvimento, será insuficiente para torná-lo apto a ser considerado um ser que tenha absorvido todo o húmus da existência e ter encerrado seu ciclo.
Não me resta dúvida nenhuma de que aqui na Terra estou vivendo apenas uma etapa da minha evolução e que outras missões me serão confiadas em vidas futuras, até que minha formação como espírito ocorra para que eu ganhe talvez para a eternidade e o homem escapará por seu mérito, subindo os degraus da justiça através de muitas vidas, no rumo do aperfeiçoamento.
Não há também dúvida de que estamos sendo testados, estão sendo pesadas as nossas boas obras e as nossas maldades, num lento e progressivo andar pela vida, numa sucessão de várias vidas em que o Criador nos dá oportunidade de exercitá-las em situações absolutamente distintas uma das outras, com a finalidade de nos completarmos como seres dignos da criação, agarremo-nos ou não a uma religião ou crença, o que importa é que atinjamos um grau de bondade e dignidade a ponto de que sejamos considerados – e nos consideremos – justos.
Não faz sentido que Deus – ou qualquer outra força superior e reguladora que contenha o conteúdo desse nome – nos jogue aqui na Terra e nos faça néscio ou sábio, faminto ou regalado, oprimido ou poderoso, saudável ou doente, desde o nosso nascimento, tornando-nos assim tão facilmente condenados ou premiados.
Nada disso, isso é apenas um dos inumeráveis ciclos de vida a que temos de nos submeter.
Até nossa "formação", muitas e muitas gerações e séculos vão suceder a este átimo de existência que nos cerca.
Não foi só esta vida que nos esperava.
Isto não vai ficar assim. Seria profundamente injusto...


***

PAULO ROBERTO GAEFK

As dores da alma não deixam recados, apenas marcas indeléveis. Não saem no jornal e não viram capa de revista.
As dores da alma precisam ser trabalhadas para que sirvam de aprendizado, e que nos permitam extrair delas a capacidade de sermos fortalecidos, aprendendo que o melhor de nós está em nós mesmos.
Quando nos amamos incondicionalmente descobrimos a autoestima, sem a qual o caminho da dor e da lamentação podem induzir à depressão.
Ame-se para amar e ser verdadeiramente amado.
Mantenha sempre os olhos abertos para ver as pequenas e grandes coisas.
Dedique-se para que suas falhas sejam menores.
Tenha amigos e seja um melhor amigo.
Sonhe, pois do sonho nasce a realização.


***

FERNANDO PESSOA

Navegue!
Encontre tesouros. Mas não os retire do fundo do mar.
O lugar deles é lá.

Admire a lua!
Sonhe com ela. Mas não queira trazê-la para a terra.

Curta o sol!
Se deixe acariciar por ele, mas não esqueça que seu calor é para todos.

Sonhe com as estrelas!
Apenas sonhe. Elas só podem brilhar no céu.

Não tente deter o vento!
Ele precisa ir para todas as partes.
Ele tem pressa de chegar.

Não apresse a chuva.
Ela deve cair e molhar muitos rostos. Não deve molhar apenas o seu.

As lágrimas, não as sequem.
Elas precisam correr na minha, na sua, em todas as faces!

O sorriso?
Esse deve se segurar. Não o deixe ir embora. Agarre-o!

Quem você ama?
Guarde-o dentro de um porta-jóia. Tranque. Perca a chave.
Quem você ama é a maior jóia que você possui.
A mais valiosa.

Não importa se a estação do ano muda, se o século vira.
Conserve a vontade de viver.
Não se vai à parte alguma sem ela!

Abra todas as janelas que encontrar e as portas também!

Persiga um sonho. Não deixe ele viver sozinho.
Alimente sua alma com amor. Cure suas feridas com carinho!

Descubra-se todos os dias!
Deixe-se levar pelas vontades.
Mas não enlouqueça por elas.

Procure!
Procure sempre o fim de uma história. Seja ela qual for!

Dê sorriso para quem esqueceu-se de como se faz isso!
Olhe para o lado. Alguém precisa de você!


Abasteça seu coração de fé! Não a perca nunca.
Mergulhe de cabeça em seus desejos e satisfaça-os.
Agonize de dor por um amigo.
Apenas saia dessa agonia se conseguir retirá-lo também.

Procure os seus caminhos.
Mas não magoe ninguém nessa procura,
Arrependa-se. Volte atrás. Peça perdão.

Não se acostume com o que não o faz feliz!
Revolte-se quando julgar necessário.

Alague seu coração de esperanças, mas não o deixe afogar-se nelas!

Se achar que precisa voltar – volte!
Se perceber que precisa seguir - siga!
Se estiver tudo certo – continue!
Se estiver tudo errado – comece tudo novamente!
Se sentir saudade – Mate-a!
Se perder um amor não se perca!
Se achar um amor- segure-o!

Circunda-te de rosas!
Ama. Bebe. E cala!
O mais é nada!

***

MARIO QUINTANA

A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são seis horas!
Quando se vê, já é sexta-feira...
Quando se vê, já terminou o ano...
Quando se vê, perdemos o amor da nossa vida.
Quando se vê, já se passaram 50 anos!
Agora é tarde demais para ser reprovado.
Se me fosse dado, um dia, outra oportunidade, eu nem olharia o relógio.
Seguiria sempre em frente e iria jogando, pelo caminho, a casca dourada e inútil das horas.
Desta forma, eu digo:

Não deixe de fazer algo que gosta devido à falta de tempo, a única falta que terá, será desse tempo que infelizmente não voltará mais!


***

Dylan Thomas
(Poeta surrealista inglês, precursor da geração beatnik)


Não entres com suavidade nesta noite serena,
porque a velhice deveria arder e delirar ao termo do dia;
revolta-te, revolta-te contra a luz que começa a morrer.

No fim, ainda que os lábios aceitem as trevas,
porque se esgotou o raio em suas palavras, eles
não entram com suavidade nessa noite serena.

Homens bons que clamaram, ao passar a última onda, como podia o brilho de suas frágeis ações ter dançado na baía verde,
revolta-te, revolta-te contra a luz que começa a morrer.

E os loucos que colheram e cantaram o vôo do sol,
e aprenderam muito tarde como o feriram em seu caminho,
não entram com suavidade nessa noite serena.

Junto da morte, homens graves que vede com um olhar que cega
quanto os olhos cegos fulgiriam como meteoros e seriam alegras,
odiai, odiai a luz que começa a morrer.

E de longe, meu pai, peço-te que nesta altura sombria
venhas beijar ou amaldiçoar-me com tua cruéis lágrimas.
Não entres com suavidade nesta noite serena,
revolta-te, revolta-te contra a luz que começa a morrer.

***

DORES DA ALMA E O FADO

Não há dor que não possa servir para tema de um fado. A música portuguesa certamente, embora até possa cantar outros sentimentos, não seria construída se não houvesse o fado, lamento do destino, para cantar as dores do amor e as dores da alma.
A dolência e a melancolia, tão comuns no fado, teriam sido herdadas dos cânticos dos Mouros, que permaneceram no bairro da Mouraria, na cidade de Lisboa após a reconquista Cristã. Contudo, não existem registos do fado até ao início do século XIX, nem era conhecido no Algarve, último reduto dos árabes em Portugal, nem na Andaluzia onde os árabes permaneceram até aos finais do século XV.
Os fadistas, cantores de fado, classicamente trajam-se de negro. E é no silêncio da noite, com o mistério que a envolve, que se deve ouvir, com uma "alma que sabe escutar", esta canção, que nos fala de sentimentos profundos da alma. O fado então faz chorar as guitarras que o acompanham.
O fado canta o sofrimento, a saudade de tempos passados, a saudade de um amor perdido, a tragédia, a desgraça, a sina e o destino, a dor, amor e ciúme, a noite, as sombras, os amores, a cidade, as misérias da vida ou ainda críticas à sociedade.

Primeira vez ( Frederico de Brito )

Primeiro foi um sorriso
Depois, quase sem aviso,
É que o beijo aconteceu.
Nesse infinito segundo,
Fora de mim e do mundo
Minha voz emudeceu.

Ficaram gestos suspensos
E os desejos, imensos,
Como poemas calados,
Teceram a melodia
Enquanto a lua vestia
Nossos corpos desnudados.

Duas estrelas no meu peito
No teu, meu anjo perfeito,
A voz de búzios escondidos.
Os lençóis, ondas de mar
Onde fomos naufragar
Como dois barcos perdidos!

Os lençóis, ondas de mar
Onde fomos naufragar
Todos os nossos sentidos!



***

Até ao fim do dia (ToZé Brito)

Então está tudo dito, meu amor
Por favor, não penses mais em mim.
O q1ue é eterno acabou conosco
E este é o princípio do fim.

Mas sempre que te vir
Eu vou sofrer,
E sempre que te ouvir
eu vou calar,
Cada vez que chegares
Eu vou fugir,
Mas mesmo assim amor
Eu vou te amar.
Até ao fim do fim
Eu vou te amar.

Então está dito, meu amor,
Acaba aqui o que não tinha fim,
Para ser eterno tudo o que pensamos,
Precisava que pensasses mais em mim.

Para ti pensar a dois é uma prisão,
Para mim é a única forma de voar.
Precisas de agradar a muita gente,
Eu por mim só a ti queria agradar.



Aguarda-te ao chegar (Cristina Viana e Carlos Viana )

Calas-me a voz, voz do olhar,
Sinto que o tempo tarda em chegar.
Distante, ausente sinto apertar
O peito ardente por te encontrar,

Na minha alma que anseio urgente
Pelo momento de ter-te presente,
Pelo infinito estendo meus olhos
Um mar de mil desejos, aguarda-te ao chegar.

Encho minha taça vazia
Com perfumes de poesia,
Bebo a saudade amarga e fria
E então adormeço ao luar.

Calas-me a voz, p’ra lá do tempo,
Estrelas que caem por um lamento
Espuma na areia, solta no vento
O meu silêncio, meu sentimento.

Em minha alma que chora vazia
Por um momento se acende a magia,
P’lo infinito estendo o meu sorriso
Num mar azul de sonhos
Acorda-me ao chegar.

Encho minha taça ardente
Com o incenso doce e quente,
Sirvo a beber à alegria
Que sinto ao ver-te chegar.

III. RECONHECENDO AS DORES DA ALMA

Dores da alma, emocionais e afetivas




Confundem-se dor emocional ou afetiva com as dores da alma. Em ambas não se consegue identificar a ocorrência de lesões materiais, morfológicas ou estruturais. As dores da alma podem resultar em alterações do comportamento ou ainda modificar condições emocionais ou afetivas, estas frequentemente influenciadas pela dor crônica.

As dores da alma, embora intercorrências da vida, evoluem direcionadas a interferir na evolução espiritual do homem. Testemunhas silenciosas do sofrimento na luta contra os obstáculos íntimos, educam, moldam e forjam o comportamento do Homem na construção de seu próprio destino.

A inadequação do espírito humano à insensibilidade, ignorância, inexperiência e ao inconformismo é uma realidade que pode gerar uma desestruturação íntima, frequentemente compondo as raízes do sofrimento. Sementes que frutificam em dores da alma.

A doutrina espiritualista admite dentro da concepção de alma doente ou com dor o resultado de várias experiências de vida sucessivamente acumuladas, constituindo um padrão de evolução espiritual maior ou menor, no qual a dor pode ser o instrumento mais comum de progressão na escalada do espírito.

No Brasil a figura ímpar de Francisco Cândido Xavier – o Chico Xavier- assumiu durante anos o compromisso,através de vasta obra psicografada,a divulgação do espiritualismo em toda a plenitude de seus ensinamentos e dogmas quase nem sempre esclarecidos. Desde que as mentes estejam abertas para o novo ou para o imponderável, as dores da alma podem ser melhor entendidas e abordadas quando interpretadas através da luz espiritualista.





Chico Xavier

Os ensinamentos psicografados de Hammed conjugam conceitos de psicologia inseridos nessa doutrina. Através deles as dores da alma podem resultar de diferentes níveis de sofrimento, alguns decorrentes de condições individuais associadas ao comportamento diário. Assim- - as privações dos enfermos, seja em enfermarias comunitárias, seja em apartamentos privativos; - a escassez dos necessitados sem teto, nas ruas ou nas comunidades carentes; - o anônimo e os conflitos morais ou a celebridade e os conflitos afetivos.

Todos de alguma maneira sofrem; - sofre o insignificante ante a falta de importância; - sofre o notável, o político e o administrador público perdido nas tramas do poder; - sofre a mãe milionária ou paupérrima pelo destino dos filhos; -sofremos quando, preconceituosos, nos recusamos a aceitar novas experiências e idéias.

Sofremos ainda quando não aceitamos a natureza da fragilidade e a irrelevância de todos nós; - ou quando a rigidez de nossos pretensos princípios gera a inflexibilidade e estagnação de nossos conceitos mais íntimos.

Sofremos principalmente quando a voz interior não é levada em consideração, permanecendo sepultada em nossos corações; ou quando o apego doentio refuta o amor incondicional.

Sofre também quem assimila o conflito como parte integrante de seu eu interior, e não como circunstância passageira.

Ou ainda quando a cada dia as circunstâncias da vida nos surpreendem negativamente, promovendo a dor de várias situações, a maior parte das vezes inesperadas:


- a decepção,
- a sensação de errar, enganar, magoar,
- não amar o próximo,
- a perda de um amigo,
- a traição,
- a ingratidão,
- a perda das ilusões,
- a fome de amor,
- a falta de confiança no futuro,
- não reconhecer as lições do passado,
- o sonho estraçalhado,
- a angústia,
- a incerteza,
- a insatisfação,
- a amargura
- a falta de reconhecimento de nossos esforços,
- a perda de objetivos,
- a desesperança,
- a falta de uma oportunidade,
- a adversidade,
- a sensação do nunca mais...

Dentre todas essas circunstâncias, uma das mais importantes é o sentimento da mágoa, que quando se cronifica destrói até mesmo a razão. Sinal alarmante de desequilibro, pode determinar em quem a cultiva até enfermidades físicas ou psíquicas.
Uma vaidade ferida, qualquer sentimento não correspondido pode ser o ninho no qual se instala a mágoa, que como chaga cancerosa invisível, progressivamente se desdobra, terminando por corroer a saúde da alma.

Quase sempre faz-se acompanhar de outros sentimentos malévolos como a aversão, que estimulam o ódio, etapa crítica do processo destrutivo.

Levando-se em conta que o homem acaba sendo o resultado de sua vida ou saúde espiritual, é fácil entender que suas idéias e aspirações se constituam no campo vibratório onde seu espírito transita e também se nutre. Dependendo da qualidade dessas vibrações se concretizam ou não condições propícias para a instalação das dores da alma.

O melhor antídoto para a mágoa é o perdão. Citando Joana de Angelis “– o perdão beneficia aquele que perdoa, propiciando-lhe paz espiritual, equilíbrio emocional e lucidez mental. Felizes são os que possuem a fortuna do perdão para a distender largamente, sem parcimônia. O perdoado é alguém em débito; o que perdoou é espirito em lucro”.

A alma definitivamente sofre, é esmagada pela dor da perda de um filho. Ainda que no útero materno. Ainda que nunca reconhecido o sorriso de esperança ou nunca tenha acompanhado os passos dos pais. Pais que não foram preparados para sobreviver a morte de um filho. A perda maior. Não apenas a descontinuidade do próprio eu. Mas a dor dilacerante de um futuro que nunca se concretizará. Sonhos perdidos irremediavelmente. Perdas jamais esquecidas, porque nunca concretizadas. Um amor nunca desabrochado, retido indelevelmente pela ausência jamais compensada!















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(nova página)


Dores da alma e dores da família



“ Nenhum homem é uma ilha isolada. Cada um de nós é parte de um promontório ou um continente.”
John Done.




Todos fazemos parte de um promontório ou de um continente,ninguém está só ou vive só. Dependemos uns dos outros em cada momento de nossas vidas. E nos relacionamos tão intensamente que um não pode viver sem o outro. Esta é a chama da vida que por gerações tem alimentado o coração do homem. Mesmo que ele não creia nisto ou assuma alguma forma de solidão voluntária.

Esse tipo de dependência estabelece uma ordem de relacionamento baseado no amor ao próximo. Até mesmo em relação ao próximo desconhecido. Mas é sobretudo dentro da família que os sentimentos se emaranham definindo padrões de amor que transcendem até mesmo várias gerações.

As experiências negativas reconhecidas dentro de um sistema familiar podem marcar tão profundamente seus integrantes, que até seja possível uma repetição em gerações futuras que as revivem inconscientemente. Por exemplo se uma injustiça foi cometida em gerações anteriores, esta será representada e sofrida posteriormente por alguém da mesma família, como uma forma de restauração da ordem de relacionamento familiar.

Esta é a tese do psicoterapeuta Bert Hellinger, especialista em dinâmica dos sistemas de relacionamento família, e profundo conhecedor das forças que nele atuam. Oriundo de uma família católica, foi marcado pela SS, no tempo do nazismo, como "inimigo do estado", ainda muito jovem. Mesmo assim, foi convocado e serviu ao exército alemão. Capturado na Bélgica, posteriormente, fugiu e voltou para Berlim. Após esse evento, tornou-se padre católico trabalhando entre os zulus africanos, Lá, conheceu a dura realidade do apartheid, e trabalhou, favorecido pela visão mais aberta dos padres anglicanos, com dinâmicas de grupo. Mais tarde deixou a batina para se dedicar plenamente à terapia familiar, onde construiu a técnica de formação de constelações familiares.

A partir de uma nova abordagem da psicoterapia sistêmica tem procurado reconhecer ou tocar no amor que existe na alma, e nas dores da alma resultantes da falta desse amor. Ou dos desencontros e tragédias que desestruturam os sistemas familiares.

Alguns conceitos hellingerianos merecem destaque pela sua originalidade ou delicada percepção da realidade familiar.

A liberdade é essencial como prevenção das dores da alma. Em relação à liberdade, melhor dizendo ao livre arbítrio de cada um de nós sobre nossas condutas Bert afirma: - O ser humano não é livre. A liberdade é limitada. Pode ele trilhar vários caminhos diferentes, mas o fim de cada um deles é predeterminado. Por exemplo, regras básicas podem ser infringidas voluntariamente, contudo a vontade não tem poder de influenciar as consequências dessas infrações. As conseqüências são predeterminadas.

A felicidade é uma conquista da alma. A alma infeliz padece de dores que se repetem constantemente. Sobre ela escreveu Hellinger:
- A felicidade almejada pelo “eu” nos escapa com facilidade. Nós crescemos quando ela se vai. A felicidade da alma chega e permanece, cresce conosco.

Traduzindo – a felicidade se estabelece e se modifica dentro de cada fase da vida. Cada fase tem sua própria ordem de fatores, seu grau de sensibilidade e percepção. Seus próprios limites da satisfação. A criança é feliz no ventre da mãe. Depois isto não é mais suficiente: ela nasce e se aconchega no colo materno. Mais tarde também isto já não basta e ela caminha em busca de seu destino. Depois a curiosidade inquieta do crescimento, e a impaciente ânsia de liberdade da adolescência antecedendo a procura por uma profissão, novos compromissos, o casamento. Em seguida com os filhos tudo se renova e repete – sempre novas fases que se sucedem. Nas quais a felicidade sempre é procurada de forma diferente, e ligada sempre às condições de percepção de cada momento.







DORES DA ALMA E O IDOSO

Na sociedade e nos tempos atuais os mais jovens, qualquer que seja a idade, não tem mais tempo para os mais velhos. E estes se ressentem amargamente dessa condição, pois sua experiência de vida,a maturidade e o amor aos seus entes queridos mais jovens, somente fazem com que a ansiedade de tentar transmitir o que para eles é tudo de bom, resultem em frustração e aborrecimento.
Na realidade o idoso é como João Baptista, citado na Bíblia como a voz que clama no deserto. Não é ouvido, e nas raras oportunidades que os jovens lhes dão, são considerados ultrapassados, quando não repetitivos e desinteressantes.
A ironia maior é que os jovens de hoje serão idosos, e passarão pelos mesmos momentos,guardadas as diferentes épocas.
Ninguém gosta de envelhecer. A velhice dói. Não bastassem as alterações do corpo que limitam as funções individuais, pior ainda é a perseguição e discriminação social que todos sofrem ao demonstrar os primeiros sinais do envelhecimento.
Bem comparando, é o que sucede quando a sociedade percebe circulando nela, indivíduos trajados com vestes velhas, fora de moda opu desgastadas, ou mesmo dirigindo automóveis fora de linha, de potência menor, e que eventualmente não cedem passagem aos modelos mais novos e potentes. Nessas condições além do desprezo, o idoso sem qualquer culpa, a não ser a de existir, causa eventualmente ira e intolerância.
Esses fatos,tão comuns,geram uma progressiva insegurança no idoso, que a exemplo de conceitos da antiga Grécia, deveriam aguardar pela morte, e assim ceder caminho para a progressão dos mais jovens.
Entretanto nada mais enganoso e acomodado do essas idéias. Ser velho não deve significar ser fraco ou mesmo uma pessoa cansada., fragilizada. O envelhecimento é necessário, para que a sabedoria e a experiência acumulada possam auxiliar o desenvolvimento das novas gerações.
Mesmo se elas ainda não perceberem que sua própria sobrevivência dependerá de uma redefinição de suas próprias condições de envelhecimento. Da mesma forma que a sociedade industrial não pode prescindir da natureza, a sociedade atual tecnocrata e informatizada não pode nem deve deixar de considerar a experiência dos idosos, em termos de sabedoria e autoconsciência.
Em verdade caso se perpetuem as condições até humilhantes infringidas aos idosos, geralmente excluídos socialmente da comunidade, e considerados de mentalidade estreita, conservadora e pessimista. Isto resultará progressivamente em um clima de temor e insegurança em relação ao futuro.
A geração atual tem mantido um culto extremado pela juventude e pela beleza, manifesto seja nas expressões da arte, da propaganda, da promoção social e como demonstrativo dos padrões de melhor qualidade de vida. Com isso, cria-se uma velhice de imagens sombrias, ironicamente cada vez mais próxima dessa geração, e cada vez menos concordante com a realidade mundial de nossos dias.
Eis porque em geral as pessoas tentam camuflar a progressão da idade, seja com procedimentos cosméticos, seja através da cirurgia plástica, prática de esportes, alimentação saudável e de uma medicina preventiva atuante.
Isto fez com que nos dicionários mais completos o número de verbetes médicos nos últimos cinco anos relacionados de algum modo ao envelhecimento aumentasse em 40%.
Na realidade imprime-se hoje o conceito de que envelhecer é uma condição capaz de nos trazer vergonha. Daí a ausência de idosos na maioria dos programas de televisão, cinema e propaganda. Tal qual a quarentena de uma doença contagiosa.
Ao invés de ser avaliado e valorizado como uma notável experiência interior, o envelhecimento ainda é considerado um tabu social.
O antagonismo do jovem em relação à velhice já é introduzido desde a tenra infância, quando a mente das crianças já é povoada de imagens em contos de fadas e histórias infantis, com velhos que passam a imagem de medo, quando não terror ás crianças. Lembrem-se das histórias de João e Maria, Rapunzel, Moura-torta e Branca de Neve. Nelas as crianças aprendem que o Mal pode geralmente assumir a condição de um velho, que necessita ser evitado e combatido.
Mesmo assim, progressivamente com o aumento da expectativa de vida, as populações estão envelhecendo,e os idosos tem se tornado uma significante parcela da população, e interferindo por um período maior nas condições de vida das populações. Muito tem contribuído para isto a aceleração da tecnocracia no campo das comunicações humanas.
A internet e as redes sociais tem ampliado a participação do idoso, seja no resgate de suas lembranças, seja na aquisição de conhecimentos através de uma estratégia mais fácil e lúdica.
Uma outra comparação, simples, contudo extremamente alentadora em relação à prospecção do futuro nos idosos foi atribuída e Richard Gott, astrofísico que teve a oportunidade de visitar o Muro de Berlin e o secular círculo de pedra de Stonehenge. Comentando sobre a transitoriedade do Muro de Berlin, apesar de seu intenso significado de discriminação social e étnica, pronunciou-se dizendo “ tudo que existe por um período de tempo suficientemente longo, terá chances cada vez maiores de existir por mais tempo que aquilo que existe há menos tempo.”
A Ciência já demonstrou através de evidências formais, válidas para o século XXI, que os indivíduos que atingem idades mais avançadas (90 anos) podem se mostrar mais lúcidos e criativos do que quando tinham 80 anos. Também que a mortalidade do ser humano até pode se tornar menor, à medida que a idade avançada passa a ser ultrapassada.
Frank Schirrmacher, a partir desses conceitos, enfatiza que a grande missão do homem é envelhecer. Devemos todos aprender a chegar com harmonia , e ultrapassar com esperança os 50, 60 e 70 anos.
Deve-se procurar viver o envelhecimento sem emudecer. Sem deixar de participar.
Os obstáculos são muitos. A sociedade que crê poder definir o quanto uma pessoa pode ou não trabalhar em função do avanço de sua idade, o seu próprio reflexo no espelho e os momentos de fadiga mental.
Não se deve dar tanta importância à imagem espelhada que nos revela alquebrados e feios. Ou aos momentos de ausência nos quais o cérebro nos parece falhar porque senil. Não se pode desperdiçar os recursos intelectuais e emocionais remanescentes, pois sempre estes serão de grande utilidade.
A Cultura do idoso reflete a História do próprio Homem:quando os músculos se enfraqueceram demais, criou-se a roda; quando o cérebro se tornou mais lento, surgiu o computador; e a solidão, quando tingiu a alma de cores acinzentadas, a Arte se mostrou capaz de lhe trazer as cores da Natureza.
Os sonhos não devem ser aposentados. Muito menos compulsoriamente. O idoso enquanto mantiver seus sonhos será imortal.

II. A DOR COMO INSTRUMENTO DE CRIAÇÃO ELEVANDO O ESPÍRITO HUMANO

A dor física, embora até também possa ser causa da dor espiritual, dela difere pelo imediatismo de suas conseqüências.

Assim, enquanto a dor aguda é um sinal de alerta contra uma agressão externa ou interna, a dor crônica é um sintoma complexo e contraditório, de difícil conceituação e ainda mais difícil interpretação. Até instrumento de uma escalada social, cultural e espiritual.

A dor crônica pode revelada, dificilmente referida de modo adequado por pacientes que até mesmo nada apresentem como causa que a justifique. Principalmente a dor crônica sem causa orgânica. O conceito de memória da dor traz ainda maior variabilidade na interpretação e reconhecimento desse sintoma.

O sofrimento é um sentimento cuja força é intensa e indelével, uma vez que as grandes alegrias são mais facilmente esquecidas que as grandes perdas, causadoras de marcante tristeza.

Por outro lado, são os momentos de grandes aflições os que mais impulsionam o crescimento do homem e sua obra material e espiritual. Isto é flagrante na arte. A arte imita a vida.

A dor crônica geralmente influencia o artista e sua obra. Já a arte pode auxiliar o artista a compreender e a conviver com sua dor.

Um dos momentos de maior criatividade artística do homem foi a pintura do teto da Capela Sistina do Vaticano, por Michelangelo Buonarroti, exatamente em uma fase atormentada de sua vida, marcada por grandes explosões temperamentais e torturantes crises de gota. A pintura da capela Sistina foi obra encomendada pelo papa Júlio II, também de temperamento irrascível. O embate psicológico entre o papa e o artista, que teve nesta sua única obra de vulto como pintor, resultou, entretanto, em uma obra prima da pintura mundial.

Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simoni (1475 —1564), foi um artista completo: pintor, escultor, poeta e arquiteto italiano, considerado um dos maiores criadores da história da arte do ocidente. Teve uma vida pessoal arrebatadamente tormentosa e desequilibrada, marcada por sentimentos desencontrados, dor, decepção e inquietude espiritual.Toda essa tempestade de sentimentos foi magnificamente imortalizada nos traços fortes e relevos demasiadamente humanizados de suas majestosas esculturas: La pietá, o David, Moisés, Lo schiavo, dentre outras.

Tendo seu talento logo reconhecido, tornou-se um protegido dos Medicis, para quem realizou várias obras. Depois fixou-se em Roma, onde deixou a maior parte de suas obras mais representativas. Seu estilo caracterizou-se por assimilar as influências da Antiguidade Clássica, dos primórdios do Renascimento, dos ideais do Humanismo e do Neoplatonismo. Representou como ninguém a figura humana, centrado em especial no nu masculino, que retratou com força indescritível, e surpreendente conhecimento de anatomia.

Como arquiteto, projetou além de vários edifícios a cúpula da Basílica de São Pedro, tendo também remodelado a praça do Capitólio romano. Sua genialidade permitiu-lhe também destacar-se na poesia, chegando a escrever poemas diversificados e de muita sensibilidade.


No Brasil, Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, padecia de uma doença crônica incapacitante ( esclerose sistêmica? hanseníase ? porfiria cutânea tarda ?), que o segregava socialmente e lhe causava infinita dor física e espiritual. Em compensação exatamente na fase mais crucial de sua vida, produziu a mais legítima expressão da arte sacra no Brasil, obra devota, belíssima e resignada.

Seu um estilo barroco, relacionado ao rococó, revela o maior expoente da arte colonial em Minas Gerais e no Brasil. Toda sua obra foi realizada nas cidades de Ouro Preto, Sabará, São João del Rei e Congonhas do Campo. Suas principais obras podem ser visitadas na Igreja de São Francisco de Assis de Ouro Preto e no Santuário do Bom Jesus de Matosinhos.

Já Francisco de Goya y Lucientes( 1746-1828) na Espanha refletiu em sua pintura a dor espiritual causada por uma enfermidade desconhecida adquirida aos 46 anos, ficando temporariamente paralítico, parcialmente cego e totalmente surdo.

Com a doença, perdeu sua vivacidade, seu dinamismo, sua autoconfiança. A alegria e a iluminação que caracterizavam a primeira fase de sua pintura, desapareceram lentamente, à medida que a doença o consumia. Em suas pinturas as cores se tornaram mais escuras e seu modo de pintar ficou mais livre e expressivo. Seus fortes e coloridos contornos, representando a vida diária do ingênuo camponês espanhol, passaram com o desenvolvimento da doença a evoluir para os trágicos traços de sua fase negra, densa, melancólica e cruel

Edvard Munch (1863-1944) começou a pintar aos 17 anos, depois que sua mãe e irmã morreram de tuberculose. Outras tragédias se seguiram com a morte de outros familiares e a internação de uma irmã de 30 anos em um sanatório. O resultado foi uma arte também trágica, na qual sua mais famosa obra – O Grito – mistura dor e desespero em tons também marcantemente trágicos. A obra representa uma figura andrógina num momento de profunda angústia e desespero existencial. O pano de fundo é a doca de Oslofjord (em Oslo) ao pôr-do-Sol. É considerado uma das obras mais importantes do movimento expressionista. Estado de alma semelhante acompanhou o autor durante longos anos de sua vida.

Henri de Toulouse Lautrec (1864-1901), acometido por uma doença óssea rara – a picnodisostose - após repetidas fraturas mal consolidadas, que levaram à deformidades físicas, chegou à idade adulta com 1m37cm de altura. Segregado socialmente e humilhado pela sociedade hedonista da época, buscou a companhia de outros excluídos, retratando-os em sua arte, através de figuras marginais da noite parisiense - desocupados, jogadores, bailarinas, artistas de circo, bêbados e prostitutas.


A monumental e inicialmente rejeitada arte de Vincent van Gogh (1853-1890), repleta de traços vigorosos, reflexos da inquietude de uma alma, sem perspectiva de vida que não o fogo da paixão interior que o consumia, atitudes instáveis e incoerentes à luz dos costumes da época, resultaram em uma obra angustiada, insana e eventualmente quase violenta.

Sua vida foi marcada por fracassos. Ele falhou em todos os aspectos importantes para o seu mundo, em sua época. Foi incapaz de constituir família, custear a própria subsistência ou até mesmo manter contactos sociais. Alma atormentada, acometido por frequentes períodos de depressão, aos 37 anos, consumido pela doença mental, suicidou-se, deixando um legado artístico inigualável.


Pierre-Auguste Renoir ( 1841 —1919), um dos mais importantes nomes do movimento impressionista, teve sua obra influenciada pelo sensualismo, pela elegância e delicadeza do estilo rococó. Dentre suas obras uma das mais famosa é o Baile do Moulin de la Galete.
Os últimos 20 anos de vida, Renoir foram marcados por dor contínua e persistente, devido a uma grave forma de artrite reumatóide que o acometeu, limitando consideravelmente sua qualidade de vida. Mesmo assim o artista continuou pintando.
Com a progressiva dificuldade em manejar os pincéis, acabou tendo que amarrá-los às mãos. Com o intuito de buscar outras formas de poder expressar seu espírito criativo, dedicou-se também à modelagem e à escultura, entretento, para isso tendo de contar com o auxílio de dois assistentes Richard Gieino e Louis Morel

Jackson Pollock (1912-1956) refletiu a instabilidade da vida pessoal, dolorosamente consumida pelo alcoolismo, em um universo de traços e pingos luminosos, compondo no caos de imagens aleatórias uma revolução artística, impulsionada obsessivamente por uma alma doente, de dor crônica infinita.
Desenvolveu uma técnica de pintura, criada por Max Ernst, o 'dripping' (gotejamento), na qual respingava a tinta sobre suas imensas telas; os pingos escorriam formando traços harmoniosos e pareciam entrelaçar-se na superfície da tela.


Já a saúde débil de Amedeo Modigliani (1884-1920) foi retratada em pinturas, onde pescoços alongados eram encimados por rostos sem alegria e olhos mortiços em tons de azul e cinza. Refletindo toda a angustia da dor que lhe consumia a alma.

Frida Khalo (1907-1954), mexicana, acometida por poliomielite aos seis anos, sendo esta a primeira de uma série de doenças, acidentes, lesões e operações que sofreu ao longo de sua vida.

Evoluiu com abortos de repetição e amputações de extremidades (síndrome do anticorpo antifosfolípide?). Sua pintura de traços fortes e coloridos foi-se modificando ao longo de sua curta e atormentada vida. Dor física, acompanhada pelos fortes e controversos sentimentos causados pelo marido, Diego Rivera, também pintor, instigaram-na a produzir uma obra bem representativa dos também tumultuados momentos da história do Mexico.

Dotada de um espírito indômito, refletiu toda a ironia e a dor causada pelos seus males físicos em figuras de cores vivas e trágicas. Sua obra Coluna Partida retrata fielmente o conceito atual de dor crônica funcional – a Fibromialgia.

A esclerose sistêmica é uma doença progressiva, incapacitante e extremamente cruel, porque, além induzir incapacidade progressiva e apresentar desfecho ainda inexorável, promove uma estigmatização estética que segrega também socialmente o paciente por ela acometido.


Paul Klee ( 1879 —1940) acometido pela doença produziu uma obra artística que se transformou radicalmente, à medida que a enfermidade evoluía. Seu desenho de traços firmes e personalísticos, com extrema riqueza de cores, demonstra a influência de várias tendências artísticas diferentes, incluindo o expressionismo, cubismo, orientalismo e surrealismo. Dotada de uma perspectiva por vezes infantil sua pintura representa fielmente sua vida pessoal.

Demitido de sua condição de professor da Academia de Finas Artes de Dusseldorf, em conseqüência da rejeição de sua arte, considerada degenerada, exilou-se em Berna, onde suas pinturas, avançadas para sua época, também inicialmente foram mal interpretadas. Atualmente é considerado um dos maiores mestres de seu tempo,tendo deixado um patrimônio de aproximadamente nove mil obras de arte.


Na música o mesmo cenário se repete, como se a angústia e as dores da alma impulsionassem os diferentes autores a produzir obras imortais.

Franz Liszt (1811-1886) e sua devoção religiosa extremada, como a se penitenciar pela inquietude da alma e da vida pregressa. Intérprete de grande técnica e musicalidade,um dos maiores pianistas de todos, importante compositor,tornou-se benfeitor de várioso outros músicos da época : Chopin , Richard Wagner, Hector Berlioz, Camille Saint-Saëns, Edvard Grieg e Alexander Borodin. Percorreu todas as cortes da Europa,tendo recebido todas as honras destinadas aos grandes artistas.Morreu aos 74 anos após uma pneumonia contraída durante um festival de musica em Bayreuth.


Frederic Chopin ( 1810-1849 ), alma arrebatada e patriota, consumida pelos amores e desvarios trazidos por caminhos tortuosos. Pianista polones e um dos maiores compositores piano da era romântica. É amplamente conhecido dos pianistas mais importantes da história.[] Sua técnica refinada e sua elaboração harmônica vêm sendo comparadas historicamente com as de outros gênios da música, como Mozart e Beethoven, assim como sua duradoura influência na música até os dias de hoje.


Richard Wagner (1813-1883), segregacionista atormentado, criando as raízes da eugenia hitlerista. Compositor, maestro, teórico musical, ensaista e poeta alemão, considerado um dos expoentes do romantismo e dos mais influentes compositores de música erudita já surgidos. Responsável por inúmeras inovações para a música, tanto em termos de composição quanto em termos de orquestração. Como compositor de óperas, criou um novo estilo, grandioso, cuja influência sobre a música da época e posterior foi forte. Como poeta, escreveu o libreto de todas as suas óperas.


Ludwig van Beethoven (1770-1827), misógeno, precocemente acometido por Doença Óssea de Paget que terminou por deixá-lo surdo. Apesar de tudo deixou uma obra monumental, cujas grandes expressões foram compostas, quando a doença já lhe deixara auditivamente incapacitado. Compositor alemão, do período de transição entre o Classicismo (século XVIII) e o Romantismo (século XIX). Desenvolveu a linguagem e o conteúdo musical, sendo um dos compositores mais respeitados e mais influentes de todos os tempos. Pregava liberdade política, a liberdade artística do indivíduo, sua liberdade de escolha, de credo e a liberdade individual em todos os aspectos da vida.

Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) , talvez o mais reconhecido por sua genialidade e extrema leveza e harmonia de sua obra musical. Compositor prolífico e influente do período clássico, autor de mais de 600 obras - tidas como referências da música sinfônica, de concerto, operística, coral, pianística e de câmara.

Mozart mostrou uma habilidade prodigiosa desde a infância. Precocemente revelado, reconhecido e consagrado, também o mais precocemente acometido pela ansiedade, insegurança e alma doentia. Ao longo de sua vida, conquistou fama, porém pouca estabilidade financeira. Seus últimos anos na cidade de Viena produziram algumas de suas sinfonias, concertos e óperas mais conhecidas, além de seu Requiem. Também precoce e tragicamente desaparecido, terminando sua vida miseravelmente só e enterrado em uma vala comum – uma vida apaixonada e incompreendida. As circunstâncias de sua morte prematura foram assunto de diversas histórias e lendas.


Gustav Mahler ( 1860-1911) um dos mais conhecidos regentes austríacos e um dos maiores compositores de sua época, lembrado por ligar a música do século XIX com o período moderno, e por suas grandes sinfonias e ciclo de canções sinfônicas, como, por exemplo, Das Lied von der Erde (A Canção da Terra). Suas obras são geralmente extensas. Prodcurou romper os limites da tonalidade, mantendo na maioria de suas obras um caráter sombrio, algumas vezes ligado ao funesto. Certamente relacionado a seus períodos de angustiada depressão.



Na literatura as figuras imortais também foram forjadas pelas dores da alma e a rejeição inicial de seus pares. As obras literárias mais editadas universalmente depois da Biblia são Dom Quixote de La Mancha, Os Lusíadas e Les miserables.

Miguel de Cervantes e Saavedra, poeta, soldado, sempre teve uma vida de sacrifícios físicos e morais. Caturado por piratas sarracenos viveu anos como escravo. Libertado, retorna à Espanha onde sua obra literária atrai a inveja de seu concorrente, poeta da corte, Lope de Vega que trama sua desgraça e seu encarceramento. Mesmo assim toda a alma da Espanha encontra-se retratada fielmente na figura do esquálido, indômito e generoso Dom Quixote, o Cavaleiro da Triste Figura, sempre disposto a mover céus e terras para defender o próximo e combater o Mal, ainda que este seja representado por dragões e moinhos de vento. Inconscientemente Cervantes retrata em seu personagem sua própria vida e convicções.


Luis Vaz de Camões, também poeta e soldado, compõe seu poema épico Os Lusíadas, narrando toda a epopéia da formação da nação portuguesa durante as grandes navegações, qua acabaram franqueando à Europa regiões como a África a Ásia e as Américas. Alma ardente e apaixonada, Camões igualmente teve uma vida de perdas e sacrifícios. Ferido no olho por uma flexa durante uma batalha, soçobrou em um naufrágio, dele escapando com a roupa do corpo e salvando também o manuscrito de sua maior obra. Alternando momentos de paixão extremada e penúria, sua alma inquieta e sofrida representa igualmente o ardor e bravura dos navegadores portuguese ( As armas e os barões assinalados, / que da ocidental praia lusitana, / por mares nunca dantes navegados,/ passaram inda além da Taprobana. / E em perigos e glórias esforçados, / mais do que prometia a força humana, / entre gente remota edificaram / novo reino que tanto sublimaram./ )

Victor Hugo fez dos Miserables a mais pungente elegia ao perdão e ao amor ao próximo, resgatando os melhores valores humanos. A personificação maniqueísta do Bem – na figura de Jean Valjean e do Mal –o implacável e obstinado Inspetor Javert compõe um cenário imortal.

Sua vida pessoal marcou muito toda a sua obra. Casou-se com uma mulher por quem seu irmão era apaixonado. Em decorrência disso, Eugène, o irmão, enloquece e é internado em um hospício. No ano seguinte enfrentou a morte do primeiro filho e o fracasso literário do livro Hans da Islândia, que não agrada a crítica.

Em 1831 lança seu grande romance histórico, Notre-Dame de Paris, definindo a forma de exploração ficcional do passado que marcou o romantismo francês. O livro narra a história do amor impossível do sineiro corcunda da catedral de Notre Dame de Paris, Quasímodo, pela bailarina cigana Esmeralda e as tramas de ciúme e rancor de Claudio Frollo, o diácono da Notre Dame.

Exila-se após o golpe de estado de 2 de dezembro de 1851, passando a viver em exílio em Jersey, Guernsey e Bruxelas, onde sua alma inquita padeceu as agruras da solidão e do desterro.

Propõe uma chamada à liberação das restrições que impunham as tradições do classicismo, compondo o maior manifesto do movimento romântico na literatura francesa. Justifica a necessidade de romper com as amarras e restrições do formalismo clássico para poder então refletir a extensão plena da natureza humana.


A história da arte, em suas várias épocas, sempre demonstrou que as grandes produções e também as mais diferentes formas de criatividade, muito frequentemente estiveram associadas ao sofrimento mais moral do que físico do artista, seja na pintura, na música, na escultura – as mais grandiosas expressões do espírito humano.

Assim, compreende-se que vencer a dor crônica,significa muito mais que tratar a doença ou sua condição determinante. Superar as dores da alma pode engrandecer o espírito humano. Abrir o portal de um novo horizonte, construir um futuro melhor. Forjar as razões e as raízes de uma vida futura.